Este texto traz algumas reflexões sobre o cuidado e a autonomia na Educação Infantil. Com estas citações, realizei um estudo com o grupo de professores com que eu atuo como coordenadora pedagógica, que auxiliou significativamente a rever algumas ações e práticas que algumas vezes interferem no trabalho realizado com as crianças da Educação Infantil.
* Segundo Corsino (2009, p. 27): autonomia é: “fruto da criação de condições privilegiadas para que as crianças a experimentem desde bem pequenas, em situações relacionadas ao controle do próprio corpo (comer, vestir-se etc.) e também às atividades motoras, cognitivas e lúdicas. (...) a autonomia no sentido da independência, é fruto de relacionamentos seguros (...)”.
* “São diversas as representações que influenciam o trabalho com as crianças e determinam quem são e o que precisam. O educador age, em geral, baseado em suas representações e não em função daquela criança real que ele deveria aprender a conhecer (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 87).
* “Os bebês podem também ser vistos como seres frágeis, sem nenhuma competência, de forma que atitudes super protetoras dominam a relação dos adultos com eles. São bebês poucos estimulados, dos quais não se esperam grandes coisas. Em geral os adultos não lhes dão nenhuma autonomia e dificultam suas tentativas de aprender por conta própria, impedem a satisfação de sua curiosidade, com medo que se machuquem” (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 87).
* “Outra versão da mesma ideia pretende dirigir e controlar em absoluto o desenvolvimento infantil, oferecendo atividades programadas e planejadas com o objetivo de “passar” conhecimentos para as crianças”. (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 87).
* “Tanto em uma como em outra concepção, o que predomina é a descrença nas capacidades e competências dos pequenos, enxergando-os pela ótica do que lhes falta e não do que possuem para interagir e criar. Nessa mesma perspectiva, seus familiares, em função das dificuldades por que passam, ou são considerados a fonte de todos os males ou, na melhor das hipóteses, como seres que pouca ou nenhuma contribuição podem dar ao processo educativo. E a representação de que as crianças não podem, não são capazes, é reforçada, levando para longe, muito longe, a prática escolar da concepção da criança como protagonista de sua história” (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 88).
* “Outra representação oposta a essa é que os bebês tudo sabem, sendo importante deixá-los o mais à vontade possível. Nesse caso, a intervenção do educador é mínima e as crianças ficam presas aos seus próprios recursos e aos de seus pares. E como aprendem, então? Apenas o que já sabem... A possibilidade de interação com pessoas mais experientes sobre a cultura em que estão inseridos é sonegada! As crianças, neste caso, são abandonadas... E o protagonismo infantil não se baseia em abandono, mas em interações produtivas, em que todos os envolvidos aprendem” (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 89).
* Barbosa (2009, p.39), chama a atenção para a forma como as rotinas são conduzidas nas instituições:
As rotinas podem tornar-se uma tecnologia de alienação quando não consideram o ritmo, a participação, a relação com o mundo, a realização, a fruição, a liberdade, a consciência, a imaginação e as diversas formas de sociabilidade dos sujeitos nela envolvidos; quando se tornam apenas uma sucessão de eventos, de pequenas ações, prescritas de maneira precisa, levando as pessoas a agir e a repetir gestos e atos em uma sequência de procedimentos que não lhes pertence nem está sob seu domínio.
* “Faz parte do processo de construção da identidade sentir-se capaz e competente, o que incide diretamente na autoestima. Gosto de mim mesmo quando sei que consigo realizar alguma ação específica ou resolver um problema. Promover a competência pensando no ambiente significa planejar situações e intervenções espaciais que possam ajudar a criança a resolver problemas por si mesmas, estimulando a conquista da independência do adulto rumo à autonomia. Favorecer que as crianças façam coisas por si só, sem a vigilância constante do adulto, de forma segura e prática, como pegar brinquedos em estantes baixas, recostar-se num cantinho aconchegante quando quer descansar, alcançar seu copo de água quando tiver sede, entrar e sair de uma cadeira especialmente preparada para isso, comer uma fruta com as mãos, promove o desenvolvimento de competência e de confiança básica em si mesmo” (ORTIZ; CARVALHO, 2012, p. 66).
* Nessa perspectiva, consideramos que: Cuidar e educar é impregnar a ação pedagógica de consciência, estabelecendo uma visão integrada do desenvolvimento da criança com base em concepções que respeitem a diversidade, o momento e a realidade peculiares à infância. Desta forma, o educador deve estar em permanente estado de observação e vigilância para que não transforme as ações em rotinas mecanizadas, guiadas por regras (FOREST; WEISS, 2007, p. 2).
* As situações de cuidado são ricas em aprendizagens para as crianças, visto que elas não param de sentir, pensar, falar e interagir durante a troca, o banho, a higiene das mãos ou a alimentação. No entanto, para que os professores valorizem os cuidados como situações de aprendizagem, é preciso tornar observável o modo como as crianças participam do cuidado pessoal desde que nascem (DAMARIS; ZIRAWSKI).
* Outro aspecto fundamental é refletir sobre o processo de cuidado como base da constituição da noção de pessoa, ou seja, da constituição da identidade humana. Os cuidados requerem uma ação conjunta de seres humanos para atingir um objetivo comum, que é a sobrevivência da espécie. Requerem o compromisso e a responsabilidade daquele que cuida em relação ao outro indivíduo, naquele momento mais vulnerável devido à idade, ou à condição de saúde ou de desenvolvimento, mantendo a vida e a cultura humana (DAMARIS; ZIRAWSKI).
* Não se ensina a criança a ter cuidado com o próprio corpo “dando aula sobre higiene”, mas sim cuidando dela, valorizando esses momentos na rotina, compreendendo e respeitando sua iniciativa e seu pensamento, que tanto revela sobre tal construção e sobre a linguagem (DAMARIS; ZIRAWSKI).
* O docente pode reconhecer o processo de cuidado e a entrega da criança como um privilégio ou uma “honra existencial” – honra de ser aquele que a cuida e, ao mesmo tempo em que oferece cuidado e integridade, está também ensinando a confiar, a gostar de si, a saber de si. Escutar a criança e cuidar dela torna-se, assim, um ato volutivo do adulto/professor, que depende de sua empatia e de sua autonomia: ele pode oferecer seu cuidado, nesse sentido pleno que aqui tentamos apresentar, ou simplesmente cumprir tarefas a ele delegadas pela função, restritas ao atendimento de prementes necessidades físicas das crianças, de forma mecânica, alienada ou desinteressada, significando o cuidado com o corpo do outro como algo sem valor (DAMARIS; ZIRAWSKI).
Fontes:
* Cuidado e aprendizagem na educação infantil. Damaris Gomes Maranhão e Maria Paula Vignola Zirawski.
* Livro: Interações: ser professor de bebês – cuidar, educar e brincar, uma única ação. Cisele Ortiz e Maria Tereza Venceslau de Carvalho, 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário